1 de fevereiro de 2007

O Mal Saltitante


A morte é apenas uma consequência da nossa maneira de viver. Vivemos de pensamento em pensamento, de sensação em sensação. Os nossos pensamentos e as nossas sensações não correm tranquilamente como um rio, «ocorrem-nos», caem em nós como pedras. Se te observares bem, sentirás que a alma não é algo que vai mudando de cor em gradações progressivas, mas que os pensamentos saltam dela como algarismos saindo de um buraco negro. Neste momento tens um pensamento ou uma sensação, e no seguinte aparece outro, diferente, como que saído do nada. Se deres atenção, até podes sentir o instante entre dois pensamentos, quando tudo se torna negro. Esse instante, uma vez apreendido, é para nós o mesmo que a morte.


Pois a nossa vida resume-se a definir marcos e a saltar de um para o outro, diariamente, passando por milhares de instantes de morte. De certo modo, vivemos apenas nos pontos de repouso. É por isso que temos esse medo ridículo da morte irreversível, porque ela é, em absoluto, o lugar sem marcos, o abismo insondável em que caímos. Na verdade, ela é a negação absoluta daquela maneira de viver. Mas isto só é assim quando visto da perspectiva desta vida, apenas para aqueles que não aprenderam a sentir-se de outro modo, a não ser de instante em instante. Chamo a isso o mal saltitante, e o segredo está apenas em superá-lo. Temos de despertar em nós a sensação de que a vida é algo que desliza tranquilamente. No momento em que isso acontecer, estamos tão próximos da morte como da vida. Já não vivemos - à luz dos nossos conceitos terrenos -, mas também já não podemos morrer, pois com a vida superámos também a morte. É o momento da imortalidade, o momento em que a alma sai da estreiteza do nosso cérebro para entrar nos maravilhosos jardins da sua vida.


Robert Musil, in 'O Jovem Torless'

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7 comentários:

ensaios disse...

Chegar a esse estado de alma é mais um passo na felicidade.

pedro disse...

o blog acabou?

MySelf disse...

Claro que não!
É só uma pausa para cuidar e desfrutar ao máximo a chegada da nova Luzinha!

Maria Carvalhosa disse...

Que é feito de ti, amiga? Tenho saudades!

Beijos.

MySelf disse...

Querida amiga, tal como te disse no mail, a minha nova Luzinha tem-me tido a tempo inteiro. Mas brevemente, estarei de volta!
Um beijinho

Maria Carvalhosa disse...

Minha querida,

Que bom foi ver um comentário teu no meu blogue! Vim logo aqui a correr... para ver se havia novidades, mas não, aparentemente tudo na mesma. Foi quando entrei nos teus comentários que vi a tua resposta a um pedido de socorro meu, deixado há vários meses.
Não sei a que mail te referes, amiga. Não recebo um sinal vindo de ti há muito tempo!!!
Bom, pelo menos deu para perceber que estás bem e que a tua ausência tão prolongada se deve a uma boa causa ... a tua "nova Luzinha" só pode ser algo de positivo, quanto a isso não há dúvidas.

Por favor reenvia-me o mail, ou envia outro. Preciso MESMO de ter notícias tuas, "à séria". Fazes isso?

Até lá (que espero seja muito em breve) envio-te um abraço bem apertado e um beijo com muita ternura.

Joaquim Amândio Santos disse...

perfilam-se genes que farão história nos tempos dedicados aos sussurros...